quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Clarice... "A verdade não faz sentido, a grandeza do mundo me encolhe."


Por enquanto estou inventando a tua presença, como um dia também não saberei me arriscar a morrer sozinha, morrer é do maior risco, não saberei passar para a morte e pôr o primeiro pé na primeira ausência de mim - também nessa hora última e tão primeira inventarei a tua presença desconhecida e contigo começarei a morrer até poder aprender sozinha a não existir, e então eu te libertarei. Por enquanto eu te prendo, e tua vida desconhecida e quente está sendo a minha única íntima organização, eu que sem a tua mão me sentiria agora solta no tamanho enorme que descobri. No tamanho da verdade?
Mas é que a verdade nunca me fez sentido. A verdade não me faz sentido! É por isso que eu a temia e a temo. Desamparada, eu te entrego tudo - para que faças disso uma coisa alegre. Por te falar eu te assustarei e te perderei? mas se eu não falar eu me perderei, e por me perder eu te perderia. A verdade não faz sentido, a grandeza do mundo me encolhe. Aquilo que
provavelmente pedi e finalmente tive, veio, no entanto me deixar carente como uma criança que anda sozinha pela terra. Tão carente que só o amor de todo o universo por mim poderia me consolar e me cumular, só um tal amor que a própria célula-ovo das coisas vibrasse com o que estou chamando de um amor. Daquilo a que na verdade apenas chamo mas sem saber-lhe o nome. Terá sido o amor o que vi? Mas que amor é esse tão cego como o de uma célula-ovo? foi isso? aquele horror, isso era amor? amor tão neutro que - não, não quero ainda me falar, falar agora seria precipitar um sentido como quem depressa se imobiliza na segurança paralisadora de uma terceira perna. Ou estarei apenas adiando o começar a falar? por que não digo nada e apenas ganho tempo? Por medo. É preciso coragem para me aventurar numa tentativa de concretização do que sinto. É como se eu tivesse uma moeda e não soubesse em que país ela vale.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Esse corpo que tu carregas para todos os lugares e pra lugar nenhum. Essa saudade que tua alma suspeita é o presságio daquilo que tu não és. Por mais que tente fugir ou sublimar, aquela presença resiste, atenta ao teu olhar, a única que poderia te reconhecer no meio da multidão.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

A caveira que morava na porta do ármario do quarto.


Nina: - Mãe, ô mãe, manhêêêêêêê, tô com medo!
Mãe: - Que foi filha, tá gritando feito louca...
Nina: - É que tem um caveira ali. Ai, ai, ai.
Mãe: - Ah, filha mas não é uma caveira, é a madeira da porta do armário que é cheia de ranhuras.... Você tá imaginando coisas....
Nina: - Mas mãe, olha lá, ela tá olhando pra mim, você não tá vendo?
Mãe: - Tá bom Nina, eu vou dormir aqui com você tá? A caveira vai embora... então vamos fechando os olhinhos... relaxando....

Meia hora depois.

Nina: - Dona caveira, eu não gosto de você, não quero mais você no meu quarto. Eu vou fechar os olhos e você vai sumir. Amanhã você não estará mais aí. Não adianta me encarar. Ah, Dona caveira vai embora daí, por favor???


Meia hora depois.

Nina: - Dona caveira? Ei, cade você?


Adeus


Eu estava pensando se a gente não deveria estar mais preparados para dizer adeus, já que isso acontece a todo momento em nossas vidas. Estamos sempre nos despedindo de alguém. Apesar da primeira vez ser sempre a mais marcante, eu ando reparando nas últimas vezes. Sim, porque diferente da primeira, você nunca acha que pode ser a última e nem dá tanta importância, mas acredite, pode ser. E então, quando nos damos conta disso, o chão some. Como assim, aquele foi o último telefonema que meu pai me deu. E aquelas tardes de sábado que eu costumava encontrar as amigas mais próximas. Como saber que “aquela” tarde com todas era a última, já que uma das meninas iria morar fora? Estamos diante de situações assim o tempo todo. Passamos anos trabalhando num lugar onde poderíamos ir de olhos fechados ao banheiro e num belo dia, aquilo já é passado. Acordamos em lugares diferentes, nos sentindo idem. Mas não importa o que aconteça fora de nós, temos a incrível capacidade de “reter” quem amamos, num lugarzinho muito especial, apropriadamente aquecido, e ali é possível entrar em contato com quem realmente fica em nossas vidas, não importando que aos olhos dos outros tenha parecido que estavámos nos despedimos de alguém.